quarta-feira, 18 de maio de 2011

Comércio internacional e barreiras ideológicas

Poucas pessoas se dão ao trabalho de estudar a origem de suas próprias convicções. Gostamos de continuar a crer no que nos acostumamos a aceitar como verdade. Por isso, a maior parte de nosso raciocínio consiste em descobrir argumentos, para continuarmos a crer no que cremos.” Joan H. Robinson

A economia como ciência tem sido criticada no que diz respeito a seus pressupostos metodológicos, frequentemente classificados como descrições de ficção ou casos pouco realistas.

Em grande parte de países ainda subdesenvolvidos é notório o domínio de uma “sabedoria convencional” na formulação de políticas públicas. Frequentemente as propostas de políticas económicas estão comprometidas com ideologias e apresentam pouca adequação com as características da economia nacional. A ausência de espaços de debates científicos e apartidários tem favorecido a permanência dessa situação e os países continuam a utilizar um receituário único, genérico e sem flexibilidade.

Nenhuma prescrição política é mais consensual entre os economistas do que o do comércio livre baseada na especialização e vantagens comparativas. A abertura económica e o comércio livre são defendidos por argumentos poderosos sustentados pela teoria neoclássica com proposições que dificilmente podem ser contestados. Entretanto, não é preciso fazer muito esforço para constatar que os resultados para países já desenvolvidos são bem diferentes dos alcançados pelos países em desenvolvimento. Essa situação se explica em parte pelas falhas de mercado em nível global (externalidade, lobbies, barreiras, subsídios, assimetria de informação, propriedade intelectual, grandes empresas/monopólios, etc) que dificulta a concorrência e a livre mobilidade dos factores de produção (inclusive trabalho).

É consenso na economia que o livre comércio e a maior integração na economia mundial pode ser vantajoso para os países no sentido de que a competição estimula a inovação, permite a especialização, aumenta a produtividade que por sua vez promove diminuição nos preços. Embora defendida teoricamente, nas relações comerciais contemporâneas o livre comércio é mais excepção do que regra. Regra geral o governo intervém através de instrumentos de política comercial e seu objectivo é dar vantagem ao produtor nacional frente aos concorrentes estrangeiros. A protecção pode acontecer por meio de diversos instrumentos entre os quais: Tarifas, quotas, subsídios, monopólio estatal, leis de compras governamentais, barreiras burocráticas, necessidades de conteúdo local, controles cambiais, proibição de importação, barreiras não-tarifarias etc. Geralmente a protecção é justificada pela necessidade de reduzir o desemprego, melhoria na distribuição de rendimento, promoção da segurança nacional, melhoria no balanço de pagamentos, estimulo á substituição de importação, evitar perdas de divisas, protecção da indústria nascente etc.

Actualmente, o proteccionismo é regulado pela Organização Mundial de Comércio (OMC) cujas principais funções são gerenciar os acordos multilaterais de comércio relacionados a bens, serviços e direitos de propriedade intelectual; resolver diferenças comerciais; servir de fórum para as negociações; supervisionar as politicas comerciais nacionais; cooperar com o Banco Mundial e o FMI na adopção de políticas económicas em nível mundial.

As regras do livre comércio internacional permitem um ambiente aparentemente competitivo mas que, na verdade, é marcado por uma disputa entre países de proporções bem diferentes, com dotações diferentes em termos de tecnologia, escala de produção, infraestruturas e apoio de governo por meio de protecção e subsídios. Caracterizando uma situação que muitas vezes é citada como “Raposa livre entre galinhas livres”.

É notório que nenhum país é auto-suficiente e neste cenário importamos aquilo que necessitamos e exportamos aquilo que produzirmos. As nações não vivem isoladas e a troca aparece como condição necessária para o desenvolvimento da actividade económica. Neste sentido que o comércio internacional sempre fez parte das estratégias de desenvolvimento dos países.
O final do século passado foi caracterizado com o surgimento de clássicas ideias económicas num movimento que tem sido chamado de “neoliberalismo”. A exaltação das virtudes do mercado e das falhas de governo são características presentes na doutrina neoliberal. No receituário neoliberal encontra-se ainda a privatização, a desregulamentação e a defesa do estado mínimo. Abertura dos mercados de forma incondicional tem gerado severas criticas quanto á forma como o processo foi implementado embora grande parte de economistas concorda com o conteúdo das propostas. Entretanto, os fracos resultados apresentados pelos países tem dado força para um grupo cada vez maior de descontentes com a forma como foi conduzido o processo de globalização.

É inegável que algumas das dimensões da globalização, como os notáveis desenvolvimentos da tecnologia de comunicação pode contribuir de varias maneiras para acelerar o processo de desenvolvimento económico ao ampliar a possibilidade de integração cultural, técnica e científica com outras nações, abrir o horizonte de consumo de toda a sociedade etc. O aumento da concorrência permite melhorias na competitividade de países e é consenso em várias organizações internacionais tais como a OMC, FMI e o Banco Mundial que a liberalização comercial funciona em todos os casos como um meio infalível de combate á pobreza e aumentar a prosperidade dos países.

Com o agravamento da crise financeira e o relativo fracasso de inserção activa de vários países no comércio mundial é cada vez mais evidente as mudanças no pensamento predominante e cada vez maiores os questionamentos sobre as estratégias postas em práticas nos países ainda subdesenvolvidos, particularmente nos aspectos de longo prazo no desenvolvimento económico. A migração em massa, multidões que tentam atravessar fronteiras á procura de trabalho e escapar da miséria é evidência de que os termos do comércio mundial assim como as politicas implementadas precisam ser debatidas.
Sem a capacidade de pensar os nossos problemas e estabelecer estratégias de acção coerentes com as nossas necessidades as chances de sucesso são limitadas.

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