domingo, 22 de maio de 2011

Livre comércio, até quando?

“Nada obscurece tão completamente a nossa visão da sociedade como o preconceito económico”. Karl Polanyi

Que o comércio pode contribuir para o desenvolvimento económico de vários países ninguém duvida. Entretanto, tem algumas situações em que alguns países não conseguem se beneficiar do livre comércio e inclusive, pode existir situações que compromete o desenvolvimento de vários países. Recentemente, surgiram vários trabalhos académicos (tais como: JOSEPH STIGLITZ no livro Globalization and its discontent, publicado em 2002 e  HA-JOON CHANG da Universidade de Cambridge, no livro Kicking away the Ladder – Development strategy in historical perspective, publicado em 2002) que analisam esta situação e apresentam um quadro preocupante com efeitos devastadores que a globalização pode ter em países em desenvolvimento e em especial na população pobre desses países. Estes autores apontam pela necessidade de revisar os termos do “Consenso de Washington”.

Defendem que muitas vezes os custos para o desenvolvimento, serão muito maiores que os supostos benefícios que o livre comércio traz e que a liberalização não trouxe o crescimento económico prometido e ainda por cima aumentou a miséria. Para eles os países enriqueceram de facto porque recorreram á protecção das suas indústrias nascentes e subsídios á exportação como recomendado por Friedrich List no século XIX. Entretanto, concordam que o livre comércio é benéfico entre países de nível semelhante de desenvolvimento industrial, mas não entre os que tem diferentes níveis de desenvolvimento.

A relativa escassez de capital e trabalho especializado contribui para baixos níveis de rendimento per capita e, com frequência, impede os países em desenvolvimento de realizar economias de escala, das quais se beneficiam muitas nações mais ricas. Para que seus programas de crescimento tenham sucesso, os países em desenvolvimento necessitam de capital. Podem tanto atraí-lo como Investimento Directo Externo, pedi-lo emprestado ou importá-lo por meio do comércio internacional. Muitos países recorrem a recursos externos para financiar o investimento interno. Este facto tem agravado a divida externa de forma significativa, comprometendo o desenvolvimento futuro dos países. Muitos empréstimos acabam por financiar investimentos não-lucrativos agravando ainda mais a situação da divida.

Da mesma forma que a “saúde” das empresas são analisadas por meio de indicadores do balanço de contas publicados todo fim de ano, o desempenho de países é analisado através do balanço de pagamentos, que é o registo contábil de todas as transacções do pais com o resto do mundo.

Todos os países almejam apresentar superávits nas suas contas de balança de pagamento. A persistência de deficits no balanço de pagamentos é um indício preocupante sobre a qualidade de integração do país na economia mundial. Essa situação não será resolvida pelo livre ajustamento das forças do mercado mas sim, requer politicas públicas coerentes para estimular a produção e a exportação. Eis um dos maiores desafios para o governo em face dos nossos persistentes deficits na Balança de Transacções Correntes.

A maioria dos países industriais avançados, incluindo os Estados Unidos e o Japão, construíram a sua economia protegendo sábia e selectivamente algumas das suas indústrias até estas se tornarem suficientemente fortes para competir no mercado mundial. Actualmente, o relativo sucesso da China e a perda de competitividade e de mercados por parte dos Países da Europa e dos Estados Unidos vai trazer uma reviravolta em termos da ideologia liberalizante do comércio externo. A China tem jogado sob as mesmas regras, já é membro da OMC, tem crescido muito rápido e dominado áreas estratégicas no comércio mundial, deixando para trás grande parte dos países apologistas do “laissez-faire, laissez-passer”. O persistente deficit em transacções correntes e o agravamento da crise na Europa e nos EUA será uma forte pressão para a adopção de ideias proteccionistas. A defesa cega e incondicional do livre comércio somente fazia sentido quando estes Países eram mais competitivos que os demais. Agora com a performance apresentada pela China e na incapacidade de ganharem novos mercados o proteccionismo voltara a estar na moda, mas em moldes mais elaborados que não será possível a sua adopção por Países ainda subdesenvolvidos.

A crise financeira tem ressuscitado o fantasma do proteccionismo e tem preocupado de certa forma a OMC e vários países. Nota-se grande intervenção do estado no socorro de suas instituições de crédito e empresas que podem se perpetuar e constituir em subsídios que distorcem os fluxos de comércio ao preservar os sectores domésticos e garantir os mercados de exportações. Nesta guerra de subsídios são os países em desenvolvimento que tendem a perder, pois possuem menos recursos.

Os desequilíbrios comerciais particularmente quando grandes e persistentes podem se tornarem uma fonte de discórdia internacional. E é por este propósito que mesmo após varias tentativas é difícil de se chegar a um consenso em termos dos temas de comércio internacional no âmbito das rondas de negociação promovidas pela OMC.

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